terça-feira, 13 de maio de 2008

O teatro meu vizinho

Quem dera ter um Teatro na comunidade,
No quintal do Bastião,
Já pensou um festejo ajustado,
junto dessa região
Trem, perua, busão lotado,
mais que duas conduções,
desse jeito não dá gosto,
vou ficar e ver o Faustão.
Um barulho aí do lado,
No campinho do morrão?
Eita troço agitado,
hoje tem encenação.
O menino do Elias
Quis fazer um Hamlet,
Isso é coisa do teatro
Que o ensina e me diverte.
Meu vizinho inventou de ser artista,
Quis lembrar dos velhos tempos
do teatro de revista.
Será que isso tudo pode
ou é coisa irrealista?
Ter teatro de verdade
aqui perto da minha vista.
É, quem dera um teatro
sem metrô e lotação
duas horas, peça em um ato e
mais seis de condução,
Podia ser aqui do lado
No quintal do Bastião.

Ele Bebe Toró

Um teleférico de gotinhas empapa o fio e ruma pro telhado contíguo.
Todas as tardes minha lage vira lagoa
Aí começa explosão de bomba no infinito,
E vem clarão, e vem trovão partido, cismado numa quebradeira de ar
Onde já se ouviu?
Vieram a nascer só pra som
Foi daí que veio o som:
desse estrondo rasgado, ameaçando deixar o firmamento em dois
Depois do susto, tudo o que é animado, até o parado, dito sem vida, mineral, o elemento que for trata de pôr-se em colaboração:
Vento sonoro nas lascas de frincha de casa,
Nos conjuminados de concreto espaçados um dedo de assobio só algazarrar em tarde ruidosa.
Farfalha baderneiro o pé de amora e de tanto balanço, cheio de vestígio, ameaça desplantar, correr pra outro lugar.
Tinha folhagem, por trás da guarimã, que corria
Coloquei atenção e vi: elas caminham.
Pensei fossem grudadas na terra. Engano. Tramóia.
Com evento relampejado e perigoso
põem-se num deslocado alvoroço
Rodam com chocalhos,
Riem,
Rebolam verdes penteados
Muitas aproveitam a liberdade,
O fechar de janelas,
O escondido dos humanos podadores e namoram.
É um fornicalho
Lambuzam-se embebidas n`água
Soltam folhas, gemidos,
quebram galhos,
amontoam-se, misturam espécies.
Mas não acasalam, pura farra, sem vergonhice
É tanta dança; talvez pra compensar outros dias de fixidez.
Sei que as gotas estouram,
Podiam escorrer viscosas, mas não,
Cantam, colaboram com a tempestade sinfônica
Estalidos miúdos,
Somados,
Multiplicados,
Virando multidão,
A gota torna grossa a chuva,
Música em telha de barro,
Aposta corrida e salta da lage e
junta de outras,
coladas as gotas,
velozes,
audíveis de longe,
já são enchurrada.
Corre, corre, empurra, empurra,
faz piscina e rodela a ciscar no bueiro
Som, ação, colaboração,
Participo da festa,
Pisco os olhos pra melhor escutar,
Cuspo na lagoa,
Uma gota,
Meu
Estrondo,
agora SOU TEMPESTADE!

retomada a palavra II

Portanto,
retomada a palavra
.
.
.
Depois do intervalo
Na manhã de olhos colados,
Regresso do túnel,
satélite de campos rosas,
transgressão do coice,
linda chaga em meu juízo
E lambuzado de via Láctea
Com unhas novas e
dentes sujos
chego ao meu antigo planeta,
tenho outros desenhos na cinza,
dedos e cabelos saídos da placenta.
Gestado em calda doce e mariposa
Minha pele em tons inéditos exalando cânticos a Deusas negras;
Por hoje tenho olhos tristes e cristalinos.
O cordão, embora rompido, jorra;
Da carne, sebo e fendas disto anos luz
Emergi co’estes cortes e das tintas escorridas no corpo rabisco a letra mole recém cosida em sangue, folhas e vento sobre a ponte,
Agora,
Depois da festa...

Minotauro

Visto daí de fora sou tão comportado
A pele cerca o que quase não calo
Um lodo quente em tons metais
os gritos de veias alargadas por tremor irado,
Reparo vocês, a cultura, o barulho que fazem,
a delícia entre as pernas daquela alí, acompanhada.
Mais pra cá me perturbo, olho severo os pensamentos, crítico para comigo, faminto espiral de calcário em meu umbigo,
Escarro, xingamento, vergonha e gozo tapados com outra camada
Aí fora tá normal,
visto roupa, palavreio,
rio pouco, coisa e tal,
No miolo fica feio,
Analiso com receio
esse monstro assustado
em mim mesmo, minotauro.


25/12/2003

Cimo da Plataforma

E do cimo desta plataforma percebo que não.
Nem a uma ou a outra,
não esqueci ninguém.
Tenho multidão de faltas.
E quando o vento arde miúdo e o tempo nem noite ou dia,
a calçada um assento... Conflito,
vago por estas que não acabam.
Finda enquanto hoje,
mas memora
ganha flora, cheiro e gosto
co’formato que tivera
presenteio o que fora.
Um quase todo opera
venosa, escorrida
minha porção sincera,
repõe-me ferida
bruma, hera
na carne desprendida.
Sem coragem a matéria
não confessa o que tateia,
mesmo quando antigo
sabes sempre vivo
pois o tempo incomprido
curva e o rabo toca
cumpre o amor como destino
um refluxo
um céu
hiato
oco
E aqui
todo de novo
do tamanho de outrora.
Pétala e ponta
Rosa.

Luciano Carvalho e Maria Eunice

Novembro de 2006.

Retalhos em Sampa

Por esses dias juntei uns trapos e deitei no centro calçado de pedras brancas e pretas. Foi por aí até fechar o olho com pinga.
Então, comi um bezerro de ouro no restaurante mais lustroso da avenida.
Tomei um buzão lotado, feliz com 18 quilos de sacolas 25 de março. Quando meu baton deixava a boca mais, se foi o salto num buraco do asfalto. Joelho ralado. Ao correr da polícia por uns rabiscos no muro levei rodo, tinta na cara e murro.
Mais uma fiada de bloco e fim do trabalho.
Junta salsinha, coentro picado, refoga cebola, despeja tutano, depois alho.
Grafito
Ciência de risco
Borrifo de cor
Respira parede.
Tenho medo de menino preto,
Aperto minha bolsa no peito.
Guardo asco de cabelo amarelo,
Ponho lustro no parabelo.
Ontem, no meio da Paulista
Uma gata de olhos verdes e blusa de listra.
Prefiro ações
Bolsa de bolores.
Me vê uma coxinha.
Sai um salada no balcão Ceará.
Meu pai é baiano, minha mãe é mineira
Onde é que vamo Pará?
Graffite,
da margem à vitrine boutique.
Arte combate ou segue pro abate?
Arranca pedaço ou só cão que late?
Palpite?