terça-feira, 13 de maio de 2008

Pra não Falar em Culpa

Não estou aqui para falar em culpa,mas fica assim: a culpa é sua.
Sei que é doloroso esse tipo de afirmação, mas, que fazer? se a culpa é sua.
Mudemos o termo, talvez para seus delicados ouvidos soe cristal a responsabilidade.
Rude! podes gritar,mas a responsa é sua.
Aí você diz: nunca vi aquela criança.
E aqueles adiante?
E daí?
São seus.
Loucura, nunca os vi.
Seus herdeiros, nossos filhos.
Entendo quão Piegas esse papo de vinde a mim as criancinhas,
de irmão o próximo e blá, blá, blá.
mas não é que esse povo tem razão
e por favor sem confundir-me com mais um cristão.
Também não menciono revolução.
Aponto aqui questões que lhe pertencem, coisas tuas, intransferíveis.
Aquela chacina noite dessas na favela
sou capaz de afirmar: tens parcela.
Lunático!Gritarás.
E o verbo injusto desta praga secretada
em casebres deslizados, em chuviscos sobre a terra
Alma, lama, lodo o retrato de uma era
Na falência da esperança
No assento a ignorância , no conformismo, na fuga de tudo o que não veja seu,
Pois o abismo de um ego é a vala deste tempo;
Cego;
Continente duns tantos teus;
Já vi que és um simples comum que deseja ganhar a vida sozinho e ajudar sua família e construir a casa e ter um carro e conforto e um plano de saúde e muros altos e grades com pontas e cão feroz e passeio no shopping e balada na noite e cerca repulsora elétrica e filme oco entretenimento e pipoca e farra na praia e câmeras de vídeo na calçada e vidros fechados pra evitar assalto no centro e boa roupa e tenho uma raiva de você.
Vou enfiar agora o dedo na garganta e vomitar em você!
AAAAHHHHHH!!!!!! Asco!
Lhe desejo todo o mal comum.
Quero pra ti um seqüestro relâmpago,
só pra você o escarro do mendigo,
o pixo no teu muro e assalto a mão armada.,
seu filho cheira cocaetercola,
e desprezo dos que pedem esmola,
pra ti poluição, corrupção, inanição do pensamento,
tropeço no entulho o piso no excremento,
consumo tresloucado jorrando intensa diarréia
e corpo sarado disfarçando explosão da artéria.

Luciano Carvalho.

3 comentários:

Andressa Ferrarezi disse...

Lendo todos os poemas, fica difícil optar por um ou outro de maior beleza. Luciano, resume em palavras a implosão interna e devastação exterior. Junta delicadeza com severidade. Nítido ser hedonista que mergulha na voracidade da luta de classes e define muito bem de que lado está.
Com Luciano, seja bem vindo a vagabundagem!
Escrevo sobre "Pra não falar em culpa", acreditando ser uma das obras mais maravilhosas deste poeta. Só quem o viu declamar, sabe a força que emerge dos seus olhos. Ora calmo mar, ora vermelho sangue.

Litta Mogoff disse...

Os poemas do Luciano me inspiram a revolta. Me entorpecem de paixão, ódio e medo, me encorajam.
Espero que mais pessoas conheçam este trabalho. Que dá força como uma melodia de resistência.

Sidney Nunes disse...

Belo poema companheiro! Justifica toda minha raiva, minha indignação, espero em breve ir além da narrativa.